sábado, 4 de setembro de 2010

Eles eram tão pequenos


Tão pequenos, mas sabiam de coisas que nem o cientista mais maluco descobriria. Eram espertos de pés descalços.
Aquela ponte os separava. O rio lá embaixo ardia vontades de ultrapassagem, mas era proibido. As famílias não se davam e por anos nem se viam. Protestantes versus católicos. Eram doutrinas e culturas que não valiam à pena, mas ninguém sabia, e com viseira nos olhos seguiam o que já esperavam.
Ele corria, cansado. Seu cabelo vermelho bagunçava e bochechas rosavam, realçando as sardas. Suor escorrendo na testa. Corria dos garotos maiores jurando que quando crescesse iria se livrar de todos eles. Seria sua vingança.
Correu longe e se livrou dos brutamontes. Lembrou que sua mãe não perceberia sua ausência, estava ocupada demais se preocupando com o marido bêbado e com as “gêmeas irritantes”. Ele as odiava. Talvez por ser o único filho homem e ser tratado como “menininha” quase sempre. Queria que o pai se orgulhasse dele. Queria na verdade, ser como o pai: corajoso, destemido, dono das verdades, porque era assim que o via, não ligava para o que os outros diziam.
Viu a ponte, pensou duas vezes e correu, atravessando-a. Não se deu ao luxo de olhar quem vinha pela rua perpendicular, e num esbarrão, caiu, derrubando também o outro menino.
Não sei explicar o que se deu ali, mas foi coisa de instantes. Dizem que amigos já nascem amigos, sem precisar de balela, e assim que foi. Talvez pelo sentimento de desobediência, pela vontade de ser diferente daqueles que os criavam. Identificaram-se por serem tão diferentes e tão iguais. As idéias rolavam assim, sincronizadas, todo dia.
O outro menino era pacato. Tinha um cansaço nos olhos castanhos. Era filho único e seu pai traia a mãe com a moça da bilheteria do cinema. Adorava filmes de faroeste onde os homens carregavam uma bainha de couro na cintura, com arma antiga de cano fino. Aliás, essa era a paixão dos meninos durante toda a infância. Entravam pela porta dos fundos e enganavam o moço dos ingressos. Sonhavam em ser como os vilões, nunca como os mocinhos. Roubo de bancos, crimes, tiroteio, cavalaria.
E num dia bem normal, decidiram-se, iriam dar o fora dali, fugir, e quando conseguissem fazer tudo  o que queriam, voltariam e contariam a história pros outros. Seriam vilões de faroeste, famosos, apareceriam nos jornais.
E assim fizeram.
Mal sabiam eles que a cidade inteira os procurava, os pais desesperados querendo notícias, carros de polícia por todos os lados. Rebuliço.
Os meninos conseguiram o que queriam sem querer, ficaram mais conhecidos que os próprios atores bandidos da TV.
Os pegaram. Voltaram pra casa orgulhosos, mas não esperavam o pior: grades e cadeados. Ficariam encarcerados em suas próprias casas como pena a cumprir. A ponte parecia até maior. Eles estavam mais longe.
Essa foi a pior pena.
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O ruivo o que tinha agora, depois de tanto tempo, era no lugar das mechas vermelhas, mechas brancas e uma barba rala. E na mesma cadeira do bar onde seu pai havia morrido baleado anos atrás, estava agora sentado.
Em sua direção, o carteiro cansado caminhava. “Carta pra você”, ele disse. Estranhando, abriu o envelope e reconheceu ali, os anos que havia perdido.



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Baseado no filme “Eternos Heróis”.









Mickybo e Jojo

2 comentários:

  1. uhaiushdiauhsdiha nossa nath demorei umas meia hora pra ler tudo mai é muito bonito deu muita vontade de assistir o filme tbem!e seu desenho ficou muito bom tbmm!!!! a gente perde muitos anos por causa disso.... quero baixar o filme!

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  2. shaushuhsauahs Acho q vc foi o único que leu, ficou enorme mesmo. Não consegui resumir. Assite o filme que é legal! XD

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